“O que é apego? Estar apegado significa estar agarrado aos nossos pensamentos. É acreditar que todas as coisas existem efetivamente como a nossa mente condicionada as perceciona. Apegamo-nos continuamente a crenças e criamos divisões artificiais. Decidimos que algumas coisas são invariavelmente boas e outras não. Este apego a conceitos é fundamentado na presunção de permanência. Embora todos os fenómenos estejam em permanente mudança a mente projeta uma imagem fixa e agarra-se a ela, assumindo que as coisas são de determinada maneira sempre. Esta tentativa de ver o mundo da forma como gostaríamos que fosse e cristalização dessa imagem é referido como “apego ao ego”. Aprisionados por apegos, ignoramos oportunidades de nos libertarmos e crescer.
Estar confinado a um quarto pequeno sem espaço para nos movermos para trás ou para a frente cria um retraimento no corpo. Quando queremos mudar de posição não temos espaço, portanto sofremos. Movemo-nos um pouco para um lado mas é desconfortável na mesma. Sofremos a cada movimento, porque os nossos movimentos são constringidos. Este é o efeito que o “apego ao ego” e a avidez têm tanto no corpo como na mente. Criamos um espaço diminuto e esconso para nós e para os outros por reprimirmos o amor e a compaixão. O apego ao ego, a avidez e o pensamento dualista tornam-nos limitados e defensivos de tal forma que transmitimos essas qualidades aos outros, tornando toda a gente desconfortável.
A porta deste estreito quarto está totalmente aberta, mas se não passamos por ela pode muito bem permanecer trancada e sofreremos essas limitações. Quando abrimos o nosso coração e mente e amamos todos os seres de igual forma, libertamo-nos para o infinito, a realidade para além de todos os limites conceptuais, a natureza original e primordial da mente que é eternamente aberta e livre. Ao abrir mão do apego ao ego, estamos meramente a retornar à natureza primordial tal como é e sempre foi e será.
Ao acarinhar noções dualistas como bem e mal absolutos, desenvolvemos inconscientemente esperanças e medos que conduzem a ciclos emocionais de exaltação e depressão. Evitamos o que não gostamos e assumimos que existe algo de bom a que nos devemos ligar (apegar) e no qual devemos depositar as nossas esperanças. Se estes pressupostos não forem incontestados, a esperança e o medo podem destruir a nossa visão dos fenómenos e destruir-nos. Perdemos o nosso poder e verdadeira identidade sob a sua influência. Onde são originados as esperanças e os medos? Numa mente dividida por conceitos dualistas. A mente é a principal fonte de tudo.”
Este pequeno texto foi extraído do comentário do Venerável Khenchen Palden Sherab Rinpoche aos “Ensinamentos sobre as deidades iradas e pacíficas”. Para mais informação queiram pesquisar este título na Internet. Outras palavras-chave: Zhi-Khro
O Budismo, que é apenas um conceito em si, define os ensinamentos de Buddha e torna-os tangíveis para as nossas mentes conceptualistas ajudando-nos a definir a via para a libertação do samsara, o ciclo interminável de nascimento e morte fundamentado na ignorância.
Tangível mas não imediato uma vez que para os entender verdadeiramente é preciso estudar, contemplar e meditar. O estudo é a fonte da sabedoria, a contemplação consiste na reflexão contemplativa dos ensinamentos e a meditação a abertura da Visão que leva à libertação.
Uma boa forma de contemplar os ensinamentos é observar as nossas próprias vidas e os estados mentais que originaram os acontecimentos que mais nos marcaram. Ao contemplar este excerto é praticamente impossível não rever acontecimentos das nossas vidas que foram marcantes. Uns que queremos evitar a todo o custo, outros que gostaríamos de repetir. Outra forma é contemplar o nosso estado mental nas pequenas coisas. Por exemplo, quando vemos um bolo delicioso num expositor de uma pastelaria qual é o estado emocional que nos assalta? O desejo de o ingerir, de sentir aqueles sabores intensos no na boca, de colocar as papilas gustativas em êxtase. Chegamos a salivar só com essa perspetiva. Não é assim? Se não resistimos e entramos na pastelaria, assim que metemos o bolo na boca e sentimos as sensações que conhecemos e queremos reviver, logo surge o medo de que todas estas sensações acabem pois percecionamos o bolo como algo finito. Quando o bolo efetivamente acaba ainda queremos repetir. Sabe sempre a pouco. É claro que este é apenas um exemplo e nem toda a gente morre de amores por pastelaria fina. Mas os seus processos mentais são exatamente os mesmos com as coisas em que depositam as suas esperanças e medos.
Desejo que este pequeno bolo vos abra o apetite para o Dharma. Quando se prova com uma mente aberta é como o bolo…queremos mais. A grande vantagem é que não é prejudicial para a saúde, torna a mente mais clara, melhora as nossas vidas e as dos outros. A mente é a fonte de todas as coisas.
Que todos os seres venham a possuir a felicidade e a causa da felicidade,
Que possam libertar-se do sofrimento e da causa do sofrimento,
Que possam nunca se separar da felicidade que é ausente de dor,
Que possam permanecer na incomensurável equanimidade que é livre do apego aos próximos e aversão aos outros.
Post by Luís Jordão